maio 04, 2009

Fazendo um balanço

O que mais gosto no reconstrucionismo:
- tratar os deuses como indivíduos reais (com preferências e coisas que os ofendem e com os quais você desenvolve um relacionamento de consideração mútua), não como meros arquétipos ou entidades encantadas;
- que se assemelha mais a uma maneira de abordar a religião (com um método tradicional, ou mesmo a uma comunidade de pessoas reunidas nessa abordagem) do que a uma religião;
- os rituais são simples, com velas, ofertas, preces, hinos, conhecimento da história das deidades, sem exigência de pompa e circunstância;
- os chamados "UPG" (Unverified Personal Gnosis - conhecimento pessoal não verificado) são possíveis, com os deuses nos revelando coisas antes desconhecidas;
- que os deuses esperam que pensemos sozinhos e busquemos a máxima de "conhecer a si mesmo" e não o seguir o que alguém nos diz;
- o fato de ele ter me dado o estudo que eu precisava para formar uma base sólida de princípios.

O que não gosto que pensem do reconstrucionismo:
- que é uma reencenação de uma sociedade que terminou e não uma fé viva;
- que se trata apenas de estudo e análise e filosofia e retórica, com pouca prática;
- que se interessa mais pela cultura do que pelos deuses;
- que imediatamente classifica os não-reconstrucionistas como ecléticos que desrespeitam as tradições e só compram livros do tipo 'new age' feliz e fofinho (o que não é verdade, cada pessoa é um caso);
- que somos obrigados a cultuar os Doze igualmente, o que seria praticamente impossível (como um nômade se conectaria profundamente com Héstia? e como às vezes parece que uma deidade está nos mandando não se meter com certos assuntos? e pra que serviriam então os patronos? e as identificações naturais que temos com um ou outro deus individualmente?), há uma diferença entre respeito e adoração - se você e uma deidade não se dão muito bem, tentar criar um relacionamento com ela através de adoração é até falta de respeito (ao Seu desejo já expresso);
- que não permite que você cultue outro panteão, uma vez que isso pode sim ser feito desde que separadamente, com "cada um no seu quadrado", o caso contrário (de misturá-los no mesmo rito ou abordá-los como sendo os mesmos deuses) é que é problemático;
- que romantizamos o passado como se fôssemos saudosos daquela época e rejeitássemos a atual (ora, nenhuma época ou povo foi ou será perfeito, já que sempre há seres humanos -imperfeitos- dentro dela).

O que me afasta um pouco do reconstrucionismo (mas nem por isso me leva pro ecletismo):
- quando minha sede de saber e de estudo me leva a alargar meu foco e conhecer outras coisas que não entram na prática helênica tradicional.

Contabilizando os mortos e feridos, concluo que:
- há mais coisas que NÃO me adapto dentro do ecletismo do que dentro do reconstrucionismo, e meus interesses não são do tipo de ficar entre essas duas coisas, mas sim de olhar fora e longe desse pedaço grego e ocidental de mundo, então fica mais fácil me manter reconstrucionista no helenismo e ter outras práticas fora dele (que não se imiscuam nem possam confundir alguém que me visse realizando um rito);
- meus interesses vêm e vão, como as tantas vertentes pelas quais já passei e pratiquei e ainda me seduzem, mas o que tem ficado e o que me guia são os preceitos gregos mesmo;
- sou uma pessoinha que (entre perdas e buscas) vive se (re)encontrando, rsrsrs.

9 comentários:

  1. muito interessante, me aguçou o interesse a questão

    "que não permite que você cultue outro panteão, uma vez que isso pode sim ser feito desde que separadamente, com "cada um no seu quadrado", o caso contrário (de misturá-los no mesmo rito ou abordá-los como sendo os mesmos deuses) é que é problemático;"

    se possível gostaria de saber mais sobre...

    no mais entendo bem a essência do texto, em vista de que eu sou uma metamorfose ambulante ;)

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  2. Esse post esta fantastico!!Me fez perceber que o Reconstrucionismo não é tão rigido qto me parecia.....Sempre me surpreendendo, sempre aprendendo por aqui!

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  3. Lu - é aquela tecla que eu bato sempre: o que não pode é fazer salada devocional, dizer que venus/ishtar/afrodite/freya/etc é tudo a mesma coisa e fazer um ritual para elas, porque cada panteao tem um jeito diferente de ser abordado ritualisticamente; mas se vc separa e faz uma coisa pra cada uma, respeitando as individualidades delas, não vejo problema.

    Íon - acho que o problema não é da abordagem, mas é de quem escreve o que lemos por aí sobre ela, porque realmente vejo entre os americanos alguns reconstrucionistas mais rígidos (tipo o Tim) batendo de frente com outros mais abertos (tipo o San, que mexe com Egito também) e depois gente que acaba deixando de ser recon por crer nessa rigidez (tipo o Ruad, que segue Hermes), e no meio de tudo há quem se mantenha íntegra (tipo a Anny). Eu sinceramente prefiro que no Brasil nós lembremos da nossa multiculturalidade, nossa tendência a não segregar (até o racismo brasileiro é mais velado que o americano), e transportemos isso para nosso comportamento dentro do reconstrucionismo. Penso que deve haver tanto o respeito ao outro quanto o respeito à tradição antiga, e dosar isso em algo equilibrado é uma arte.

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  4. Eu penso as mesmas coisas da minha tradição rsrsrs. O balanço final sempre é legal... Mas cá entre nós: tem muito "pagão" achando que os deuses são estatuas mortas

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  5. Cada vez passo a te conhecer um pouco melhor, como eu já disse antes.

    E esse é um ponto exatamente sobre o qual eu tinha curiosidade.

    Embora eu não tenha as mesmas crenças, eu me surpreendi em ver o modo como você pensa sobre esse assunto e essas práticas que fazem parte da sua vida.

    Achei o texto bastante maduro e esclarecedor.

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  6. No Reconstrucionismo Celta há muuuuuuita rigidez... o que acaba por tirar o gás de quem deseja se entender dentro dele...

    Obrigada pela explicação ;)

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  7. Muito equilibrado esse post, pois. Gostei bastante.

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  8. Obrigada a todos! :D

    Lu, quanto aos celtas, talvez eles interpretem a questão dos druidas e da estrutura de "colégios" como algo fechado, principalmente porque os ensinamentos só eram passados oralmente (não escritos), que também daria esse caráter de segredo. Acredito que, se eles se concentrassem no ensinamento básico (“Adorar os Deuses, não fazer nada de mal e praticar a bravura”), não precisariam se preocupar com rigidez. Mas não entendo muito de celtas, provavelmente saibas disso melhor do que eu. ;*

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  9. A vontade de adorar outros fora do panteão de devoção eu ainda n tive. E acabou que eu n me liguei a um deus anteriormente a me encontrar.
    Então eu leio sobre outros deuses, gosto muito, mas n bate a vontade de fazer alguma coisa por eles como eu tenho com os meus.
    E acho complicado misturar as coisas até por questão prática. Imagine fazer os festivais gregos e celtas, p. ex. É muita coisa, dá pra ficar bem perdido nessa. Mas uma misturinha aqui ou ali n mata ninguém. Todo mundo fazia e ninguém morreu por isso. XD

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